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Após ter estado no DDD o ano passado como guest artist, Djam Neguin volta este ano para apresentar Na-Ná nos dias 28 e 29 de abril.
Djam Neguin, artista multidisciplinar cabo-verdiano, traz a história do Funaná ao Festival Dias da Dança. Uma das versões acerca da origem deste estilo musical conta que Funa tocava gaita e a sua companheira Na-Ná tocava ferrinho. No entanto não há qualquer registo de Na-Ná. Ao longo desta performance, Djam Neguin vai explorar a história do Funaná, que está cristalizada numa iconoclastia de masculinidade e ruralidade santiaguense.
Na-Ná relembra-nos da omissão que as mulheres têm sido alvo ao longo da história, na escrita da história. O que pode estar no âmago dessa omissão, desse apagamento?
Há um provérbio africano que diz..."Enquanto a história da caça ao leão for contada pelos caçadores, os leões serão sempre predadores". Quem controla as narrativas, controla o mundo. E sabemos que vivemos num mundo embainhado pela lógica heteropatriarcal colonial machista que tem colocado o feminino numa posição objetivamente subjugada. Essas omissões e apagamentos históricos são estratégias para fazer predominar no imaginário um mundo de domínio masculino.
O futuro tem a solução? De que forma?
O futuro tem a solução na medida em que ele se constrói agora. A perceção ocidental linear do tempo (também de herança judaico-cristã) moldou-nos o entendimento do tempo enquanto uma linha reta. Todavia, há outras possibilidades temporais (muito mais interessantes a meu ver). Talvez, entender o tempo como um vórtex contínuo em que o presente, passado e futuro são absolutamente intersectados e intercambiáveis.
O futuro é também o não-tempo. É o único local que podemos habitar com absoluta imaginação. E por isso, as narrativas que queremos prevalecer precisam ser contadas agora.
E não é possível contar estórias sem conhecer a História (aquilo que já se passou) e sermos capazes de interromper as ficções que têm dominado os arquétipos e inconscientes coletivos e mundificado as nossas experiências com base em opressões e silenciamentos.
A sua arte está muito ligada às suas origens. Entre a inevitabilidade e a consciência dessa escolha, como tem construído o seu percurso?
Tem sido um dos meus imperativos ontológicos e autopoéticos - a busca de mim através da recuperação da minha ancestralidade cultural para depois, antropofagicamente, fazer emergir as minhas próprias ficcionalidades. Esta trajetória tem se concretizado na forma de vários materiais artísticos que resultam dessas investigações que normalmente são permeadas pelo desejo de cruzamento de linguagens e multisensorialidades. Tem sido uma jornada interessante que tem me possibilitado encontrar um lugar de extrema auto-fruição e ao mesmo tempo uma interface com as questões que atravessam o meu tempo e contexto de existência, enquanto um artista negro que precisa de estar a enfrentar constantemente o maquinário da decolonialidade.